Em declarações a quatro órgãos de comunicação, incluindo o Mercado, o Presidente da Western Union para África e Europa e Médio Oriente, Jean Claude Farah, afirmou que a instituição nunca deixou o País, mas foi “obrigada” a restringir o serviço de transferências monetárias em 2014 devido a escassez de divisas verificadas em Angola com queda do preço do petróleo que originou o período de crise. Entretanto, o responsável da líder mundial norte-americana elogia as medidas tomadas pelo BNA para implementar reformas estruturais e construir uma base económica sólida para o País.
O que levou à suspensão dos serviços da Western Union em Angola?
Nunca saímos de Angola, estamos cá há 20 anos. Com a queda do preço do petróleo em 2014, passou a haver carência de divisas no País e desde aquela altura, o Banco Nacional de Angola (BNA) decidiu direccionar as divisas para a compra de equipamento, materiais de saúde e produtos alimentares. Portanto, passou a ser difícil aumentar as remessas com acesso às divisas. Embora nunca tenhamos abandonado Angola, a verdade é que os negócios começaram a baixar. Hoje começamos uma nova era, o BNA diz que há divisas disponíveis, o preço do petróleo está estabilizado, por isso, estamos em condições de relançar as nossas operações.
Em que se vai basear a parceria estabelecida com o BNA?
Primeiro a confiança. Somos clientes fiáveis com procedimentos de relevância em termos de políticas de transferências de capital. Em segundo porque vamos fazer retornar ao mercado o serviço de remessas tal como se verificava em 2014.
E o que é que esse regresso representa para a imagem da empresa?
Trabalhar com os governos nacionais e com os reguladores é de extrema importância para nós. Foi por essa razão que nos últimos anos, apesar de termos mantido sempre os serviços de recepção de dinheiro operacionais, os nossos serviços de envio estiveram limitados respeitando, como não poderia deixar de ser, as regulamentações nacionais do sector. Hoje, graças aos esforços significativos do BNA, para implementar reformas estruturais e construir uma base económica sólida para o País, estamos novamente em condições de oferecer aos nossos clientes uma oferta integrada de recepção e envio de dinheiro. Voltamos a fazê-lo com a conveniência e rapidez através dos nossos mais de 100 agentes locais distribuídos por todo o País.
O que o mercado angolano representava nas operações da Western Union antes da suspensão da actividade no País?
Por sermos uma empresa cotada em bolsa não posso avançar valores que dizem respeito apenas a um mercado. Posso dizer que até 2015 éramos a empresa líder em termos de recebimento de dinheiro. E um outro aspecto tem a ver com o facto de a nossa estratégia não estar apenas voltada aos níveis de relação que tínhamos na altura, mas queremos ir além disso. Queremos expandir-nos, tendo em conta a dimensão da empresa, e a isso adiciona-se o facto de termos agora a intenção de introduzir um projecto digital nas nossas operações.
Será que este retorno vai abrir portas para o enquadramento de capital humano nacional?
Queremos contratar um director de mercado para Angola e a nossa pretensão é que seja um cidadão angolano. Dependendo do desenvolvimento do mercado e das operações, vamos avaliar o que precisaremos em termos de recursos humanos. Este quadro vai ajudar-nos a avaliar essas necessidades e a contratar o pessoal necessário.
Que outros serviços estavam disponíveis, além das transferências, durante o período que deixou de operar no mercado interno, uma vez que afirma nunca ter abandonado o País?
Nunca paramos as nossas operações, houve uma redução, mas o serviço continuou disponível por via dos nossos parceiros para aqueles clientes que tivessem necessidade de usá-los. Fizemos o relançamento das actividades. Os nossos serviços abarcam transferências (recebimentos ou envios) por via de contas bancárias, mas nós agora estamos a relançar o serviço “P2P”, ou transferências de pessoa para pessoa.
Que desafios podem enfrentar em Angola, visto que o mercado está mais dinâmico e tem novos players?
Um dos desafios que vamos enfrentar é o facto de o mercado angolano estar bastante atractivo para os players e naturalmente a concorrência vai estar também interessada neste mercado. Mas isso não é um motivo de preocupação para nós, porque se tivermos um bom serviço, vamos estar em condições de servir os nossos clientes. Vejo essencialmente três grandes desafios: o primeiro é sabermos com que rapidez poderemos nos reintegrar no mercado. Por esse motivo é que estamos a contratar outro recurso local para estar em contacto com os nossos parceiros e clientes.
Qual é o segundo desafio, no caso?
O segundo tem que ver com a rapidez que podemos digitalizar as nossas operações para sermos parte da indústria que está em evolução. Em função das reuniões que tivemos com os nossos parceiros, pude perceber que eles também estão nessa jornada de digitalização. E o terceiro desafio é fazer com que os nossos clientes adiram rapidamente ao serviço, porque na mente destes, estávamos fora do mercado, mas a nível operacional continuamos presentes.
Com quantas instituições financeiras a Western Union trabalha directamente em Angola?
Neste momento temos uma relação activa com o Banco Comércio e Indústria (BCI), Millennium Atlântico (BMA) e a Unitransfer. Já tínhamos alguma relação contractual com os outros bancos, mas está mais ou menos adormecida e temos a perspectiva de recuperá-las. A ideia da Western Union é expandir-se para melhor servir o maior segmento possível de mercado.
Há a possibilidade de olharem também para outras instituições financeiras, como por exemplo as casas de câmbio e operadores de remessas?
Dentro do mercado angolano, actualmente, a nossa intenção não é excluir nenhum player mas agora uma das nossas prioridades é ver como podemos fazer a inclusão financeira dos nossos clientes. Trabalhamos para o mercado e queremos ver como é que podemos desenvolvê-lo e oferecer as nossas competências. Estamos prontos para colaborar com outras instituições. E olhando para a inclinação do mercado, queremos passar do factor retalhista e avançar mais para o aspecto digital. Se olharmos para as actividades pré-COVID-19, a digitalização constituía mais ou manos 5% das actividades e hoje constituem 20%. Portanto, observa-se uma grande evolução neste aspecto.
O que quer dizer com a digitalização das operações?
A digitalização da operação significa que alguém a partir da sua casa, conectado a um computador ou smartphone pode fazer esta operação de transferência usando a Western Union. E isto é apenas um exemplo, pois esta operação poderá ser feita por via de um website ou por via de um aplicativo e eventualmente podemos aplicar em Angola o aplicativo próprio da Western Union, na medida em que actualmente estamos a usar os aplicativos dos nossos parceiros.
Em que países não se pode enviar dinheiro via Western Union?
Neste momento, não temos presença em apenas dois países do mundo, nomeadamente a Coreia do Norte e o Irão. Isso não tem a ver com falta de oportunidade, mas com regulamentos e sanções internacionais. Se as sanções forem retiradas desses países, tenho a certeza que seremos os primeiros a entrar nestes mercados.
Quanto tempo demora uma transferência via Western Union?
Desde o momento que oferecemos ao cliente o número de controlo de transferência monetária, o dinheiro fica imediatamente disponível. Por exemplo, se alguém quiser enviar dinheiro para outra pessoa que esteja no exterior, usando a Western Union, logo após a operação é-lhe dado o número de identificação da transacção. A partir do momento que o cliente do outro lado receber o número de identificação e for ter com o funcionário da Western Union do país receptor, o dinheiro fica imediatamente disponível. Isso também acontece quando creditamos uma conta bancária e nós podemos creditar uma conta em 5 minutos.
Qual é o limite de valores monetários que se pode transferir via Westn Union?
Actualmente o valor máximo para envio e recebimento de dinheiro é de 2 mil USD por pessoa, por mês. É uma das questões que abordamos com o BNA, no sentido de aumentar este limite. Quando as operações estavam no seu melhor em Angola, eram de 5 mil USD.
As moedas digitais, sobretudo as criptomoedas, têm ganhado terreno a nível mundial, isso não representa uma ameaça para os vossos serviços?
Qualquer coisa pode representar um perigo daqui a 5 ou 10 anos. Sendo a Western Union uma empresa líder nas transferências monetárias a nível mundial, é natural que tenhamos olhado também para as moedas digitais ou criptomoedas e se decidirmos avançar com as moedas digitais temos que nos certificar que faremos seguindo os aspectos de compliance. Neste quesito, o banco central de moedas digitais é um elemento com quem poderemos certamente trabalhar, porque o nível de compliance nesta instituição é bastante elevado. No que diz respeito às criptomoedas, ainda há um caminho a percorrer, teremos de ter cuidado e observar até que ponto os aspectos de compliance serão respeitados e seguidos.
De modo geral, qual é vossa estratégia para África e em particular para Angola?
A nossa estratégia para Angola, e para África no geral, é especificamente desenhada para se ajustar ao caminho que o mundo está a seguir, prestando muita atenção às necessidades dos nossos clientes e focando na forma como podemos dar um apoio mais amplo às comunidades. Queremos que todos possam beneficiar do dinheiro em tempo útil. Hoje, para além de receber dinheiro, os nossos clientes em Angola podem enviar dinheiro para os seus entes sem dificuldade através de pontos comerciais em mais de 200 países e territórios e directamente para contas bancárias em mais de 130 países e território em todo mundo.
Jean Claude Farah
Como Presidente da Western Union para África, Europa e Médio Oriente, Jean Claude Farah é responsável por impulsionar o rápido crescimento nos negócios de transferência de dinheiro de consumidor para consumidor da empresa, adoptando canais inovadores e avançando em pagamentos para atender oportunidades de mercado em toda a região.
Farah ingressou na Western Union em 1999 como Gerente de Marketing. Ocupou vários cargos de responsabilidade, incluindo Director Regional, Vice-Presidente Regional, Vice-Presidente Sénior para a região do Oriente Médio, Paquistão e Afeganistão (MEPA) e Vice-Presidente Sénior, Oriente Médio e África.
Jean Claude Farah iniciou sua carreira em 1995 na Renault SA, onde adquiriu ampla experiência em marketing. Antes de ingressar na Western Union, foi gerente de Área da Orangina Pernod Ricard, uma das principais marcas de bebidas do mundo. Nasceu no Líbano, estudou e trabalhou em França. Actualmente reside em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. É bacharel em Administração de Empresas pela Universidade St. Joseph no Líbano e possui MBA pela Ecole Supérieure de Commerce de Paris.